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Desafios da implementação de programas e políticas públicas de desenvolvimento infantil

O primeiro painel do evento reuniu duas experiências em grande escala em realidades bem distintas. De um lado, Tiago Falcão, Mestre em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), à frente da Secretaria Extraordinária para a Superação da Extrema Pobreza, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, para falar sobre “A implantação em escala do Programa Brasil Carinhoso”. Do outro, Linda Biersteker, chefe de pesquisa na Early Learning Resource Unit (ELRU), na Cidade do Cabo, África do Sul, Mestra em Psicologia pela Universidade de Cape Town e uma respeitada liderança na pesquisa e implementação de políticas públicas à Primeira Infância, que teceu considerações sobre “A experiência da África do Sul”.



Tiago Falcão abriu o painel, mediado por Ely Harasawa, Gerente de Programas da FMCSV, falando da complexidade do cenário brasileiro, de diversidades e incongruências. Também ressaltou o momento social do país, fornecendo dados que mostram os avanços, nas últimas duas décadas, nos quesitos como diminuição da miséria e da mortalidade infantil, acesso à educação infantil, dentre outros aspectos que contribuem ao desenvolvimento humano e, especialmente, ao desenvolvimento infantil.

Para Tiago, o Brasil ainda está se esforçando atrás para suprir problemas herdados dos séculos 19 e 20, paralelamente aos que afligem a população neste século. Exemplifica esse fato com a existência de escolas que sequer têm água versus escolas que estão discutindo políticas para a distribuição de tablets aos seus alunos.

A falta de creches é um dos grandes entraves do nosso tempo. Cerca de 13% dos municípios brasileiros (649 cidades) não têm nenhuma vaga para oferecer às crianças pequenas. Os dados revelam a desigualdade social também nessa fase da vida: quase a metade dos 10% mais ricos da população tem acesso a esses espaços educativos enquanto apenas um décimo dos 10% mais pobres ocupam frequentam creches.

Uma das iniciativas da política social do governo federal foi a criação de um cadastro único para mapear a realidade dos domicílios brasileiros, a partir do Bolsa Família, integrando ações em torno do Programa Brasil sem Miséria.

Por meio das informações do cadastro, a construção de políticas públicas tem respaldo e referências para ações como Minha Casa, Minha Vida; Água para Todos; Luz para Todos e programas voltados à Primeira Infância.

O Brasil sem Miséria conta com a participação dos 22 ministérios e recebeu a adesão de todos os estados e municípios. O Programa Brasil Carinhoso é um dos braços dessa política mais ampla e envolve intervenções na área da Saúde, Educação e Renda, tendo como base, segundo Falcão, a lógica multidimensional.

No que diz respeito ao público infantil, o Brasil Carinhoso tem trabalhado para que programas como o Bolsa Família sejam repensados e alcancem núcleos familiares mais pobres, com gestantes, nutrizes e crianças pequenas.

Na educação, os esforços visam estimular, com recursos extras da escala federal, que os municípios priorizem as crianças do Programa Bolsa Família na hora de distribuir as vagas em creches.

Na área da Saúde, o Programa Brasil Carinhoso ampliou a oferta dos Programas Saúde da Família e Saúde na Escola para creches e pré-escola a partir de 2013. Também tem articulado outras políticas já existentes, como a prevenção de carência de vitamina A, especialmente nas crianças de zero a três anos, aproveitando as campanhas de vacinação; distribuição de sulfato ferroso em todas as UBS (Unidades Básicas de Saúde); medicamentos gratuitos da farmácia popular também para crianças, especialmente àquelas acometidas por doenças como asma.

Mas, dentre alguns entraves, há a falta de integração de recursos e legislações (não se pode comprar fraldas para as creches com a verba da educação, por exemplo), assim como uma lacuna entre algumas intervenções e a comunidade a que se destinam ou, ainda, estruturas de assistência bem organizadas nos municípios, mas encapsuladas nos CRAs (Centros de Referência de Assistência Social).

“Temos um laboratório de políticas sociais em curso que precisa ser observado para trocas para que o Brasil possa se desenvolver de maneira mais equitativa”, conclui Tiago Falcão.

Do outro lado do oceano, uma realidade bastante complexa compõe o cenário da África do Sul, trazido por Linda Biersteker ao Simpósio.

Naquela parte do continente africano, vivem 52 milhões de habitantes. Desse contingente, 52% encontram-se abaixo da linha de pobreza. São 6 milhões de crianças de zero a quatro anos e quase um milhão com cinco e seis anos.

A cada 1000 crianças com menos de cinco anos, 57 não sobrevivem e um dos responsáveis pelo alto índice de mortalidade infantil do País é o contágio pelo vírus HIV.

O desenvolvimento infantil muitas vezes é trabalhado apenas na área da educação. Neste momento, um Plano Nacional, que envolve a criança até quatro anos, está em fase de implementação e pretende fazer a integração transversal de intervenções para a saúde materna e infantil, o apoio psicossocial e a assistência social.

Uma das alternativas para ampliar o alcance das intervenções foi a criação de equipes que se deslocam aos domicílios de regiões de difícil acesso e de famílias que não costumam frequentar os grandes centros. Esse trabalho, que leva saúde e educação às crianças, é realizado pelo poder público e ONGs, em parceria.

O País tem pela frente grandes desafios para melhorar as condições da criança pequena e seus familiares: avançar no alcance das campanhas de imunização, realizar registros de nascimento (que só recentemente passaram a ser feitos onde a criança nasce), garantir acesso à água potável a 90% da população (o que não significa ter água em casa), conquistar a participação da família nos programas de educação infantil, cuidar da nutrição das crianças (que, em grande parte, tem seu desenvolvimento comprometido), melhorar a situação das mães (para combater os altos índices de depressão pós-parto), capacitar educadores e cuidadores, e melhorar a infraestrutura das creches e escolas.

A atual falta de integração do já dito Plano Nacional é outro obstáculo, assim como a inexistência de planejamento, de dados uniformizados, de prestação de contas e do compromisso dos profissionais com a Primeira Infância.

Você pode ter acesso ao material da apresentação de Linda Biersteker para saber mais. É só clicar aqui.

 

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